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Dom Vilsom Basso: “ser uma presença humana, solidária, de alguém que estende a mão”

Em entrevista ao padre Luís Modino, o bispo de Imperatriz relata situações das famílias atingidas pelas enchentes no Maranhão.




Por padre Modino - CELAM


Nas últimas semanas, o Brasil sofre as consequências das enchentes, que tem provocado centenas de mortes, milhares de desabrigados e muitas perdas materiais, com famílias que perderam tudo. Uma dessa regiões é o Estado do Maranhão, segundo relata nesta entrevista dom Vilsom Basso, bispo de Imperatriz, onde o Rio Tocantins está 13 metros acima do nível.


O bispo relata situações de pessoas conhecidas e o trabalho que as dioceses do Maranhão atingidas estão fazendo. Uma situação que deve levar a todos, especialmente os católicos a refletir e tomar consciência da necessidade de uma conversão ecológica e de cobrar políticas públicas do poder público.


Diante da dor, dom Vilsom destaca a importância de ser presença humana, solidária, no meio do sofrimento do povo. Também quer deixar uma palavra de esperança, de ser uma Igreja que acolhe na hora do sofrimento. “Uma Igreja que é Mãe, que acolhe, que estimula, que dá esperança e que recebe dentro de suas portas, dentro de suas casas, aqueles que perderam seu lugar”. Confira abaixo a entrevista completa:


Qual a situação que está vivendo nas últimas semanas o Estado do Maranhão e a região onde o senhor é bispo diante das fortes chuvas e as enchentes que estão acontecendo?


Todo o Maranhão é cortado por grandes rios, e aqui em Imperatriz é o Rio Tocantins, que nasce quase em Brasília, e vai pegando todas essas chuvas, ele está 13 metros acima do nível. De fato, ele saiu e tem alagado vários bairros da cidade de Imperatriz, com mais de mil desabrigados.


Estive visitando dois grupos de desabrigados, são pessoas que a gente conhece, comunidades carentes que a gente acompanha. Uma dessas comunidades, Nossa Senhora dos Navegantes, da Beira Rio, nós apoiamos uma horta comunitária lá, com 29 famílias, uma área grande, e ficou totalmente alagada.


Tudo o que fizemos o ano passado, inclusive como apoio de um projeto da REPAM-Brasil e a Diocese de Imperatriz, essas hortas comunitárias está tudo debaixo da água. Famílias numa experiência de horta comunitária, para uma vida melhor para eles, para vender e ter uma qualidade de vida maior.


Tem o Rio Itapecuru, que nasce na diocese de Balsas e passa por dentro da diocese de Imperatriz e de Coroatá, que também está bem fora, tem alagado muitos bairros, residências destas dioceses. E também o Rio Grajau, que depois se junta com o Mearim, todos eles têm crescido bastante e saído dos seus leitos. São muitas famílias atingidas em todo o Estado do Maranhão.


Como a Igreja do Maranhão está tentando responder diante desta situação, quais são os passos que estão sendo dados como Igreja para ser um auxílio para tantas famílias que sofrem?


Até esse momento é uma ação de cada diocese. Nós aqui em Imperatriz, desde o momento que começou, fizemos uma campanha de doação de alimentos, de roupas, utensílios domésticos, milhares de cestas básicas, conseguimos através de uma empresa 40 geladeiras novas, para famílias que perderam as geladeiras e faz chegar até elas.


Aqui na Diocese de Imperatriz é um trabalho bem-organizado, fomos a primeira instituição, Igreja, que assumiu esse trabalho. Um trabalho que a gente já fazia antes, durante a pandemia, fizemos a campanha “Por um Natal sem fome”, onde distribuímos para as famílias mais de 30 toneladas de alimentos, e imediatamente, veio essa enchente.


As outras dioceses, Balsas, Grajau, Caxias, Coroatá e Bacabal, que são as mais atingidas por esses rios que por ali passam, tem essa ação em cada diocese. Do dia 25 a 29 de janeiro, teremos a reunião dos bispos do Maranhão, e uma das pautas é uma ação conjunta como Igreja do Maranhão. Até o momento, uma ação que cada diocese está fazendo, pela urgência, agora no final do mês sairá uma campanha como Igreja católica no Maranhão, Regional Nordeste 5, como pauta da reunião que teremos no final do mês dos bispos do Maranhão em São Luís do Maranhão.


A gente vê que as enchentes e as secas, em consequências das mudanças climáticas, cada vez estão mais presentes no Brasil e no mundo. Como a Igreja pode ajudar a conscientizar o povo, principalmente os católicos, sobre a necessidade de cuidar da Casa Comum?


É um fato, e eu sou testemunha porque eu estive visitando minha família no Sul do Brasil por uns dias, e de fato lá a perda é muito grande, com perda de produções, de soja, de milho, afetando, porque no Rio Grande do Sul tem muitos pequenos produtores. Isso é um fato, aqui no Nordeste, Norte, chuva demais e no Sul faltando.


Nós acreditamos que a Igreja tem sim um papel decisivo. A partir do próprio Sínodo da Amazônia, essa ecologia integral, tem que cuidar do Planeta para que as pessoas, que são a parte principal, possam ter uma vida digna e não vivam todas essas calamidades. Acreditamos que há uma necessidade dessa consciência global, mas acima de tudo a possibilidade de cada diocese, cada paróquia, cada comunidade, fazer ações concretas, tornar o mundo melhor na realidade que a gente vive.


Sem dúvida, a Igreja católica tem um papel decisivo, e nós com a capilaridade que temos, em todas as comunidades do país, devemos fazer mais do que nunca esse trabalho. Porque se alguém não acreditava em mudanças climáticas, agora, com o que estamos vivendo em nosso país, não tem como não estar consciente disso. Se considera um momento duríssimo, mas ao mesmo tempo um momento importante para a gente conscientizar e fazer a nossa parte.


O senhor fala que não tem como não ter consciência disso, mas a gente vê essa falta de consciência muitas vezes no poder público, que se desentende diante do sofrimento. Como impulsar desde a Igreja políticas públicas que realmente cobrem e fiscalizem esse cuidado do meio ambiente e esse compromisso para evitar, na medida do possível, essas catástrofes que continuamente acontecem no Brasil?


Todo nosso trabalho como Igreja é na dimensão do Reino, da colherinha de fermento, da pitada de sal, de ser sal, de ser luz. Em primeiro lugar, a Igreja deve dar testemunho de que é possível, na consciência de que somos pequenos, mas que as coisas do Reino funcionam assim. A primeira parte é nós como Igreja darmos testemunho de ações que mudem para melhor essa realidade.


Em segundo lugar, acredito, sim, que como organização, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, os regionais, as dioceses, fazer ouvir a sua voz diante das autoridades. Tanto nacional, como estadual, como municipais, e exercer através de lideranças que nós temos em todas as instâncias, senadores, deputados federais, estaduais, vereadores, que são pessoas da caminhada, são pessoas da comunidade, são pessoas que tem essa consciência, política e ecológica. E a través deles exercer essa força, exigindo, cobrando, políticas públicas que preservem a natureza, que preservem o meio ambiente, e todas as políticas sociais que melhorem as condições de vida do nosso povo.


Vejo uma ação em diferentes níveis, no pequeno, mostrando que o Reino de Deus caminha na semente, no grão de mostarda, na pitadinha de sal, na colherinha de fermento. Mostrando num nível maior, cobrando pela força que temos, como nossas organizações de Igreja. E depois, a través das nossas lideranças que estão nas diferentes instâncias, nacionais, regionais, estaduais, municipais, fazer chegar até elas, e através delas, essas reivindicações e essas necessidades. Por aí, eu vejo que é possível de fato, exercer e fazer acontecer nas mudanças necessárias.


Como bispo, como pastor da Igreja, qual a mensagem que o senhor quer enviar para todas as pessoas atingidas pelas enchentes?


Eu estive agora visitando pessoas que eu conheço, a essa experiência que fazemos de apoio às hortas comunitárias, e que estão desabrigadas, que perderam tudo. E eu percebi nelas a alegria, o bispo está aqui. Ele estava na horta comunitária, ia lá, conversava, nos apoiava, e agora no sofrimento, ele está aqui também.


Eu acredito em primeiro lugar nisso, ser uma presença humana, solidaria, de alguém que estende a mão, porque isso já é uma força. E aí sim, exercer nossa solidariedade com a organização que temos, e cobrar dos poderes públicos, que eles possam exercer o que é sua competência e responsabilidade.


Eu quero deixar uma palavra de esperança. Dizia também para eles que a Igreja é assim, ela acolhe espiritualmente no templo, e que agora ela acolhe também na hora do sofrimento. Nós abrimos uma de nossas paróquias para acolher pessoas desabrigadas. Agora nós estamos exercendo plenamente a nossa maternidade. Uma Igreja que é Mãe, que acolhe, que estimula, que dá esperança e que recebe dentro de suas portas, dentro de suas casas, aqueles que perderam seu lugar. É hora de esperança, é hora de solidariedade, é hora de seguir caminhando, porque o Reino de Deus acontece assim, nas pequenas ações e obras de fé, esperança e caridade que realizamos.

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