D. Sebastião Bandeira
Bispo de Coroatá
Presidente do Regional NE5
Já estamos com quase dois anos que aconteceu o Sínodo para a Amazônia. Com a chegada imprevisível da pandemia ficou mais difícil perceber como nossas Igrejas estão assimilando as contribuições que este acontecimento nos oferece tanto no seu processo de preparação, na realização, quanto nos documentos elaborados pelos Padres sinodais e pelo Papa Francisco.
Detenho-me a refletir sobre a necessidade de buscar um novo modelo de ministérios eclesiais inculturados na nossa realidade, com tantas riquezas, mas que a Igreja está tendo uma presença muito precária nas periferias, nos lugares que influenciam os valores da sociedade, como as escolas, meios de comunicação, etc... e até mesmo nas comunidades rurais, onde antes tinha uma atuação mais marcante.
A Igreja está tendo uma presença muito precária nas periferias, nos lugares que influenciam os valores da sociedade, como as escolas, meios de comunicação.
Além da ausência prolongada da eucaristia, a própria existência da Igreja está ameaçada em muitos lugares, por falta de pessoas e de estruturas que respondam aos anseios da população, em um mundo marcado pelo mais rápido, prático, acessível e confortável.
A preocupação com esta situação, sempre apareceu entre nós bispos. Na nossa Carta Compromisso no II Encontro da Igreja Católica na Amazônia Legal, em Belém, em 2016, preparando-nos para o Sínodo, afirmamos: “Precisamos renovar os ministérios ordenados, promover e valorizar os ministérios laicais, confiando na variedade dos carismas e na força da unidade e da comunhão”. Foi ressaltado o “ministério da coordenação ou do pastoreio de comunidades” visando fortalecer o ânimo daqueles que estão em frente das comunidades e se sentem às vezes cansados e abandonados. Quanto àqueles que se preparam para o ministério ordenado, “que estejam a serviço das nossas comunidades, livres do mundanismo, do carreirismo, do clericalismo e do autoritarismo. Que saibam confiar nos leigos e nas leigas como sujeitos verdadeiramente responsáveis da ação evangelizadora da Igreja”.
Estas e outras questões foram amplamente discutidas junto com o Papa Francisco, durante o Sínodo. Nós, padres sinodais demos sugestões ousadas em torno dos ministérios, como aparecem no Documento Final do Sínodo, tanto em relação a participação das mulheres (n.103) quanto na possibilidade de novo modelo de presbítero (n. 111). E o próprio Papa afirma a necessidade de “encontrar um modo de assegurar o ministério sacerdotal, nas circunstâncias específicas da Amazônia” (Querida Amazônia, 89).
Enquanto buscamos avançar, devemos ter presente um dado importante, que é a irrupção da Amazônia como um novo sujeito e novo paradigma para a Igreja como um todo e para o contexto mundial, conforme afirma o teólogo Agenor Brighenti. A Amazônia é sujeito pela questão ecológica, que se tornou uma questão primeira, pois é fator decisivo de sobrevivência da humanidade. A natureza é sujeito de direitos, principalmente quando concebida como obra do Criador. É também pelo direito de existir dos povos originários, da irrupção dos invisibilizados, do “outro como diferente”, é a legitimidade e o direito do diferente. É o reconhecimento da autodeterminação dos povos e que não existe povo ou cultura superior.
A Amazônia é sujeito pela questão ecológica, que se tornou uma questão primeira, pois é fator decisivo de sobrevivência da humanidade.
Enquanto a Amazônia, como paradigma, é na vivência da ecologia. O “outro”, enquanto natureza, é visto como parte de si mesmo e dom do Criador, torna-se instância de cuidado, responsabilidade para com as gerações futuras e mediação de Deus. Os povos originários, como paradigma, é reconhecer o diferente não como ameaça, mas como riqueza que deve ser acolhida e valorizada.
Qualquer pessoa que queira servir em um ministério nesta Igreja deve ter as seguintes características: Não pode ignorar a questão ecológica, pois ela é evangélica, teológica e pastoral, precisando ser integrada no cotidiano de nossa ação evangelizadora. Ao mesmo tempo deve superar toda postura colonizadora na evangelização, buscando aprender e a valorizar o que existe de bom e belo em cada cultura e comunidade, evitando toda forma de convivência com os poderes que exploram de maneira irresponsável os recursos e oprimem as populações. Precisa aderir a uma Igreja em saída, missionária, fazendo das periferias o centro da Igreja, valorizando os movimentos populares que defendem os excluídos e seus direitos.
Este novo modelo irá necessariamente ajudar na inculturação das estruturas eclesiais, tornando-as mais acolhedoras, sinodais, flexíveis, participativas, com atitudes proféticas que celebram o testemunho dos mártires, e a alegria da festa tão importante na nossa vida.
Eis, para nós, um grande desafio. Além de intensificar o convite a toda pessoa de boa vontade para trabalhar para o Reino, devemos ter o cuidado na formação dos discípulos de Cristo, que mesmo precisando, Ele não aceitou de qualquer jeito, mas colocou as suas exigências: “Quem começa a arar a terra e olha para trás não serve para o Reino de Deus” (Lc 10,62).
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